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Para cada professor que entrou na rede estadual nos últimos 9 anos, 26 se aposentaram

Em nove anos, o número de professores do estado cresceu 1,11%, passando de 69.997, em 2007, para os atuais 70.776. Um acréscimo de 769 novos profissionais. No mesmo período, 20.120 professores do estado se aposentaram, aumentando de 47.072 para 67.192 (40,69% a mais) o quadro de inativos da educação. Essa é a equação usada hoje pelo governo para defender, na reforma da previdência, a inclusão, entre suas propostas, da revisão das aposentadorias especiais dos professores.

De acordo com o presidente do Rioprevidência, Reges Moisés dos Santos, essa proporção de um novo professor na ativa para cada 26 novos aposentados em nove anos é provocada por duas regras fundamentais. As professoras têm o direito de se aposentar a partir de 25 anos de serviço (e idade mínima de 50) e os professores, com 30 (e idade mínima de 55).

— Cerca de 40% de todos os aposentados trabalharam 25 anos. Cada vez mais, são menos servidores ativos para financiar a aposentadoria de mais inativos. Não há como manter isso. É necessário aumentar o tempo de contribuição — defendeu o presidente do Rioprevidência.

Entre as propostas que o governo federal vem discutindo com os 27 governadores estaduais, estão a revisão das aposentadorias especiais e o aumento, em todos os casos, do tempo de contribuição para 35 anos e de idade para até 65, sejam os beneficiados homens ou mulheres.

Mas outros dados do Rioprevidência explicam por que, apesar de terem uma aposentadoria especial, os professores não se consideram privilegiados. Embora representem 43,33% dos 154.988 inativos do Poder Executivo, esses profissionais já fora das salas de aula consomem por mês R$ 221 milhões, o que representa apenas 24% dos R$ 926 milhões gastos mensalmente pelo estado com seus aposentados.

Diferentemente dos coronéis inativos, que estão no topo das aposentadorias pagas pelo governo estadual, com soldo médio de R$ 26.500, os professores fluminenses têm uma das menores médias salariais entre todos os servidores aposentados: R$ 2.769. O valor representa cerca de 60% da média geral dos funcionários públicos, que é de R$ 4.700. Segundo a coordenadora do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (Sepe-RJ), Marta Paes, os baixos salários estão entre os principais fatores para o estresse da categoria, que é também recordista de licenças psiquiátricas no estado.

— Nossa posição é absolutamente contrária à reforma da previdência. Esse discurso de que os professores têm privilégios ao se aposentarem aos 25 anos só é defendido por quem não sabe a realidade de uma sala de aula hoje. O professor com dez anos de trabalho já tem problemas graves de saúde. Hoje nós trabalhamos em condições muito difíceis. Muitas escolas ficam em áreas de risco, professores não sabem se retornam para suas casas no final do dia. Alunos chegam cada vez mais violentos à escola, porque têm problemas graves nas suas casas. Então somos nós que fazemos o papel de mediação na sociedade, enfrentamos um cotidiano que é absolutamente estressante. E, como o professor ganha mal, para manter a família precisa trabalhar em dois, três turnos, o que só aumenta o estresse. Não há como mexer na aposentadoria dos professores. Além da saúde dele, isso vai comprometer a formação dos alunos — afirmou Marta Paes.

30 ANOS DE TRABALHO E DUAS MATRÍCULAS

Especialista em previdência, o professor Kaizô Beltrão, da Fundação Getulio Vargas, acredita que não há como manter a regra dos 25 anos para professoras e 30 para os professores. No entanto, acha que o aumento do tempo de serviço tem de ser acompanhado de cursos de reciclagem.

— No caso dos militares, eles devem ter um regime diferenciado, não só pelo risco, mas pelas condições físicas. Por isso, se aposentam mais cedo. Mas, no caso dos professores, não há como manter o tempo de 25 anos para aposentadoria, até porque eles são a maior parte do funcionalismo. Mas, em razão dos problemas que enfrentam, deveriam passar por reciclagens. É necessária uma política de reciclagem contínua que evite o (síndrome do esgotamento profissional). Hoje eles trabalham até um ponto máximo, depois sua produtividade cai, porque não conseguem mais ficar em sala de aula. Uma reciclagem no trabalho poderia ajudar — afirmou.

Depois de um período de aflição, a professora aposentada Maria da Conceição Lima comemorou o Dia do Professor com dinheiro no bolso. O estado depositou no dia 14 os recursos dos inativos e pensionistas do Rio. Com o benefício na mão, ela garantiu o pagamento do aluguel e do plano de saúde. O resto, como Maria da Conceição diz, “dá para levar”. Ela trabalhou por 30 anos, do início da manhã ao fim da noite, acumulando duas matrículas, para garantir uma aposentadoria melhor. Apesar do ritmo que enfrentou, a professora acredita que o tempo mínimo de serviço poderia ser maior que os atuais 25 anos. No entanto, também defendeu uma reciclagem.

— Hoje os alunos têm celular com internet e trazem novas questões para a escola. Os professores não podem ficar no passado. Também têm que se reciclar, buscar programas culturais. Tem muito evento gratuito. Eu, mesma aposentada, estou sempre estudando — contou.

Maria da Conceição costumava sair de casa, em Niterói, às 5h para chegar à escola em Piabetá onde dava aula às 7h. Trabalhava até as 22h. Ela disse que teve sorte:

— Às vezes, eu dormia na casa de comadres, porque não tinha como voltar para Niterói. Graças a Deus, nunca enlouqueci, mas tive um colega que morreu louco. Outro foi agredido em sala de aula. Vi muitos conflitos. Mas, tirando um câncer, consegui sair ilesa. Continuo muito ativa e acho que poderia até mesmo ter trabalhado mais alguns anos.

Já a professora de história Noceli Antunes, de 68 anos, contou que herdou uma artrose do seu tempo em sala de aula.

— Meu principal problema é a coluna. Muitas horas em pé. Eu sou contra tirarem a aposentadoria especial dos professores, até porque eles não conseguiram ainda provar que a previdência é tão deficitária. No mundo inteiro, a profissão do professor é reconhecida como uma atividade que exige muito das pessoas. No entanto, aqui temos os piores salários, trabalhamos nas piores condições. E agora ainda querem acabar com a nossa aposentadoria especial? Eu trabalhei 30 anos na Baixada Fluminense em escolas em péssimas condições, inclusive de iluminação. Salas ruins, quadros ruins, com giz da pior qualidade... Isso sem contar os conflitos sociais de crianças que não têm pais, filhos muitas vezes de mães ausentes. A gente absorve tudo isso. Por isso, com 12, 15 anos de magistério, os professores já apresentam sequelas.

PROBLEMAS NA GARGANTA COMO SEQUELA

Também professora, Sueli Antunes, irmã de Noceli, disse que ficou com problemas na garganta.

— Eu tive sorte. A sequela que tive foi essa, que me obrigou a me afastar. Nunca tive problemas psiquiátricos. Mas a gente sabe como é dolorosa a vida do professor. Agora, como aposentada, o problema é conviver com o atraso no pagamento do benefício.

Para Darcy Francisco Carvalho dos Santos, economista e especialista em finanças públicas, a previdência é hoje um dos grandes problemas do mundo e não há como não enfrentá-lo:

— São três os grandes males do mundo: a poluição, a escassez de água e a previdência. A expectativa de vida de um brasileiro hoje ao nascer é de 76 anos, para mulheres ainda mais. Então não tem jeito. É condição sine qua non o aumento do tempo de idade mínima para a aposentadoria. E, no caso dos professores, eles estão entre as maiores categorias do serviço público, o que inviabiliza a manutenção do regime que existe hoje. Acho que também precisa ser repensada a valorização desse profissional, para que ele não tenha de trabalhar tantas horas.

 

Fonte: O Globo

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