Novo plano de ocupação social de favelas divide líderes comunitários e especialistas

O anúncio de que o governo do estado prepara mais um programa de ocupação de comunidades, com a promessa de melhorar a qualidade de vida dos moradores, dividiu a opinião de lideranças comunitárias e especialistas. Batizado de Cidade Integrada, o projeto ainda está em fase de elaboração e deve ser lançado até o início de dezembro, segundo o portal G1.

A estratégia seria contemplar, de início, duas favelas simbólicas na capital: o Jacarezinho, onde há forte influência do tráfico de drogas, e a Muzema, controlada pela milícia. Haveria ainda outras duas fases em que seriam beneficiados o conjunto do Cesarão, em Santa Cruz, o Pavão-Pavãozinho e o Cantagalo, na Zona Sul, o Complexo da Maré, na Zona Norte, e Rio das Pedras, no Itanhangá.

O presidente da Associação Pró-Melhoramento do Parque Rubens Vaz, na Maré, Vilmar Gomes Crisóstomo, de 57 anos, vê com bons olhos o programa. Depois de o complexo ter sido excluído do programa das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), essa pode ser a chance de o governo demonstrar interesse em ajudar as comunidades, na opinião de Vilmar.

— Só de saber que o foco é trazer serviços, e não só botar a polícia aqui dentro, já acho que pode ter um bom resultado — diz ele, acrescentando que Castro tem mantido bom diálogo com os 16 presidentes de associação da Maré: — No mês passado, fomos ao palácio e o governador atendeu todas as lideranças.

Já Rumba Gabriel, de 67 anos, líder comunitário do Jacarezinho, onde há UPP, disse que o novo programa não foi discutido com a comunidade.

— Estou articulando com outras favelas um grande encontro para discutir essa questão. Qualquer projeto desse tipo que vier de cima para baixo jamais dará certo — diz ele. — O governo sempre vem com a polícia, nunca com projetos sociais. Será que eles querem fazer de novo aquela maquiagem (as UPPs), para depois sair matando todo mundo? Os moradores precisam ser ouvidos.

Especialistas cobram transparência

Para o coronel da reserva da PM e ex-comandante das UPPs, Robson Rodrigues, a ideia do projeto é boa. Entretanto, ele teme que os mesmos erros das UPPs sejam repetidos, como a falta de uma restruturação das polícias:

— É necessário trabalhar a política de segurança com transparência. Saber quais foram os critérios e os estudos que levaram à escolha dessas comunidades, por exemplo. Quais serão os índices de governança, não só policial, que serão acompanhados para saber se houve êxito ou fracasso? A maior armadilha de um projeto como este é ter um apelo mais político que técnico.

Professora do Departamento de Segurança Pública da UFF, Jacqueline Muniz acha difícil que o projeto saia do papel e diz que outros municípios da Região Metropolitana deveriam ter sido incluídos.

— Sem dotação orçamentária, sem cronograma, em ano eleitoral e sem recurso, tende a não durar muito. As políticas não podem ficar presas a um ou a outro governo. O que vai acontecer é apenas um aumento da presença da polícia nesses locais por um breve período — critica.

Repaginação do modelo das UPPs

Ainda não está claro, no entanto, como irão atuar as polícias nesse novo projeto. Uma “repaginação” do modelo das UPPs é um desejo do governador Cláudio Castro. Assim como no programa iniciado há 13 anos, o estado quer levar serviços às regiões ocupadas, para estar “presente” nesses espaços, o que, no entender do governador, não aconteceu com o antigo programa.

O ofício que trata sobre o Cidade Integrada diz que seu objetivo é quebrar “barreiras” ao integrar bairros formais e informais. Isso será feito por meio de “investimentos em infraestrutura, melhorias de espaços, garantia de acessibilidade, construção e reforma de equipamentos públicos, reforma de unidades habitacionais e ações sociais e de segurança pública, além de projetos que gerem emprego e renda”.

Algumas iniciativas já foram listadas, como a urbanização das margens de um rio que corta a Favela do Jacarezinho, palco recentemente da ação policial mais letal da história do Rio com 28 mortos. Em uma vistoria, diz o documento do governo obtido pelo GLOBO, os agentes fizeram fotos do local e constataram novas construções junto ao curso d’água e venda de drogas.

O texto ressalta que a “urbanização das margens inibirá a ocupação irregular, facilitará a mobilidade através da implantação de calçadas e ciclovias e vai melhorar as condições ambientais e paisagísticas, com a introdução da arborização”. Essa obra, assim como outras em estudo agora, estava prevista no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2), entre 2012 e 2016, mas nunca executada.

Ainda no Jacarezinho, o estado estuda implantar o Desenvolve Mulher, voltado para a capacitação profissional com foco na geração de trabalho e renda. O orçamento feito em 2012, na época do PAC, para reformar o imóvel onde funcionaria o projeto era de R$ 2 milhões. No Pavão-Pavãozinho e no Cantagalo, a ideia recuperar os elevadores que ajudam os moradores a chegar ao topo das comunidades. Na área da segurança, está previsto ter delegacias dedicadas aos inquéritos que investigam os integrantes das quadrilhas que atuam nessas favelas.

Cláudio Castro anunciou em maio que esse projeto já estava em estudo. Questionado sobre de onde virão os recursos para custear todas as intervenções, o governo não respondeu. No orçamento de 2022, não há uma previsão explícita para o Cidade Integrada. Em nota, a assessoria de imprensa do Palácio Guanabara disse apenas que a proposta está sendo desenvolvida com “base na estratégia e no diálogo” e que “atualmente está na fase de apresentação e alinhamento com os poderes e parceiros que o integram”.

 

 

Fonte: O GLOBO

Copyright© 2003 / 2021 - ASFUNRIO
ASFUNRIO - Associação dos Servidores da SMDS e Fundo Rio
Visualização Mínima 800x600 melhor visualizado em 1024 x 768
Gerenciado e Atualizado: Leonardo Lopes