Crescimento vertical de favelas deve ser fiscalizado, dizem especialistas

Se o aspecto visual impressiona, a ausência de fiscalização preocupa. O processo crescente de verticalização das áreas de favela no Rio, com edifícios que nem de longe lembram as antigas casas nas comunidades, reacendeu o debate sobre a questão habitacional e urbanística na cidade. Especialistas consideram um risco para os moradores e um prejuízo para o município a proliferação de edifícios sem acompanhamento técnico e legal do poder público.

Como O GLOBO mostrou no domingo, entre 2008 e 2013, a área ocupada por favelas na cidade caiu 2,16%, segundo dados do Instituto Pereira Passos (IPP). A redução de mais de um milhão de metros quadrados foi consequência de projetos de habitação e urbanização, obras de contenção de encostas e reassentamento de famílias que viviam em áreas de risco.

O decréscimo de área escondeu, contudo, um detalhe facilmente percebido em diversas favelas: a verticalização. Dezenas de prédios passaram a fazer parte da paisagem das comunidades, muitos deles erguidos sem qualquer fiscalização. A prefeitura do Rio estuda a contratação de um serviço de monitoramento das construções, o que permitiria gerar imagens em três dimensões para controlar o processo de verticalização. Atualmente, o município dispõe apenas do controle horizontal das comunidades.

Na avaliação do diretor-executivo do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), Manuel Thedim, a atual situação é crítica. Segundo ele, o processo de verticalização só poderia ser compreendido como solução urbanística se o poder público de fato incorporasse a favela à área da cidade. Com isso, as regras que valem nos bairros deveriam ser aplicadas e fiscalizadas da mesma forma nas comunidades, assim como deveria haver a oferta plena dos serviços que existem no restante do município.

— O poder público tem que olhar para a favela com o mesmo olhar que tem para o restante da cidade. Enquanto se olhar para as comunidades como um lugar negativo, da ausência, não adianta. Fazer essa mudança de olhar tem ônus e bônus, claro. O moradores das favelas terão acesso a mais serviços, como têm os moradores dos demais bairros da cidade. Em contrapartida, como acontece em qualquer bairro, a prefeitura precisa atuar para fiscalizar e acompanhar o desenvolvimento dessas áreas. Não dá para achar que é razoável se erguer um prédio de quatro ou cinco andares sem qualquer fiscalização. Há risco para os próprios moradores dessas construções — diz Thedim.

‘GOVERNO TEM QUE ESTAR JUNTO’

Para o presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Sérgio Magalhães, o que se vê hoje com o processo de verticalização é a ação do “capitalismo selvagem”, na qual o crescimento acontece sem regras ou participação do poder público para regular as relações entre os agentes — no caso, empreendedores e moradores. Magalhães concorda com Manuel Thedim. Na sua opinião, a verticalização como hoje acontece é uma prova de que a urbanização não “ocorre de forma plena” na cidade.

— A hipótese que se coloca nesse debate é a de que a verticalização pode ser uma solução urbanística e habitacional para as comunidades. Isso não faz sentido. Imaginar que isso é uma solução para as áreas pobres, porque eles podem construir como querem os seus prédios, é um total absurdo. É um contrassenso. O governo tem que estar junto, fiscalizar e acompanhar esse processo. Isso precisa ser regulado pelo poder público, como ele faz nas demais áreas da cidade. Não podemos admitir que a solução urbanística e habitacional nas comunidades é não ter governo — observa Magalhães.

O presidente do IAB explica que o poder público tem responsabilidade no processo de verticalização, porque cabe a ele identificar os fatores econômicos, espaciais e de acessibilidade que têm impulsionado a construção desses prédios:

— Só foi possível erguer prédios, por exemplo, em Ipanema, porque havia esses fatores, que demandam uma área mais que outras. Mas não foram construídos de qualquer modo. O poder público atua para fazer valer as regras urbanísticas para a cidade. Não pode ser a deus-dará.



Fonte:
Jornal O Globo

 

Copyright© 2003 / 2014 - ASFUNRIO
ASFUNRIO - Associação dos Servidores da SMDS e Fundo Rio
Visualização Mínima 800x600 melhor visualizado em 1024 x 768
Gerenciado e Atualizado: Leonardo Lopes